Entre os braços, um abraço.

Há um tempo que adotei o abraço, na vida e na escrita, ele que sempre me soou como uma saudação formal: Abç, abraço, um abraço. Também passei a observar mais, os meus abraços e abraçadores por aí. As diferenças, toques, tempos, em quem e quando o abraço se apresenta e qual a disponibilidade que havia no ato. Constatei no círculo que minha observação permitiu, que são raros, exceto na intimidade, onde em alguns casos os abraços brotam sem medida. Abraço de reencontro com familiares, – outro dia ao me demorar num desses, percebi que as lágrimas brotaram, sim, o abraço pode ser um lugar muito sensível.

E foi assim mesmo, abraçando e sendo abraçada, que senti que não há nada mais informal que um abraço. Em algumas culturas, na próxima Argentina, por exemplo, chama a atenção que os homens por lá ao se cumprimentarem nem sempre se abraçam, mas se beijam no rosto em algumas ocasiões, algo pouco comum por aqui. Já em outras culturas, como a japonesa, nem mesmo o toque físico é bem-vindo em cumprimentos, formais ou não.

Para além, ou aquém dos aspectos sociais, não sobreviveríamos sem a continência de braços que se entrelaçam, enlaçam e criam laços. Podemos pensar na estrutura subjetiva que se contorna através da continência vinda do outro que ampara. O holding, ou contenção em tradução livre, é termo cunhado pelo psicanalista inglês Donald Winnicott para se referir sobre a capacidade de acolher e proporcionar um ambiente protegido e que possa desenvolver a confiança ao bebê que explora o mundo. A capacidade de abraçar passa pelo nosso holding. Vestígios da infância, rastros atravessados por abraços, evitativos ou entregues, necessariamente denotam o nível de confiança que foi estabelecido desde muito cedo. O abraço representa também a vulnerabilidade em cena. E por medida, também nos revela.

Ali há vida a pulsar. Peito com peito evidenciam os corações colados e também calados. O abraço nos furta do contato visual e da censura. Também inviabiliza a escuta, ouvidos fora do curso das palavras. Há os curtos e os demorados. Abraços demorados poderiam representar uma categoria de liberação emotiva, uma espécie de terapia do abraço (já devem ter inventado por aí). Já que as palavras, imprescindíveis que são, serão sempre uma tentativa de sentido. Há palavras que mais parecem um abraço. Preenchidos por significantes, tentamos burlar o vazio de sentido inerente à falta. As palavras aqui somente intencionam, pois abraçar é corpo puro, o real em vigência como categoria constituinte e avassaladora.

Adepto ou não, você já necessitou e irá necessitar novamente. Mesmo que habituais, os abraços não são cumulativos, volta e meia é necessário resgatar o conforto em um, até para que se possa oferecer os braços firmes, quando alguém precisar. Só sustenta um abraço quem se deixa abraçar.

Um abraço!  07/03/24